quinta-feira, 29 de maio de 2008

Prosseguindo...

Depois disso seguimos a vida, acho que cada pessoa reage aos traumas vividos de uma forma.

Fiquei numa apatia por meses, tudo era normal demais pra mim, parecia que minhas emoções estavam anestesiadas, não ligava nem me importava com nada.

Mas havia um sentimento profundo de incapacidade, impotência, a auto-estima desce tão profundamente que parece que some.

Continuei trabalhando e fazendo as coisas corriqueiras da vida, lavando, limpando, passando, visitando os amigos...

Um dia, muitos meses depois, uma amiga nos telefonou pra contar que estava grávida, ficamos muito felizes por ela e seu marido, mas confesso que aquele dia foi dolorido pra mim, chorei o dia inteiro e pensava: "Deus...você esqueceu de mim?" Eu realmente me alegrava na gravidez das outras mulheres, mas me lamentava profundamente de não viver aquilo também. Me esforçava ao máximo para não transparecer os meus sentimentos, não queria ser poupada das experiências das minhas amigas grávidas.

Viviamos diversas situações, muitos nos perguntavam: "Quando terão filhos??" e sempre respondíamos: "Quando Deus quiser...!". Teve uma vez que uma mulher que não nos conhecia muito bem, mas sabia um pouco de nossa estória, me inqueriu sobre ter filhos, falou que eu já estava casada há um bom tempo e que não devia resistir a isso, ela me dava inúmeros argumentos pra ter filhos, que são uma benção, herança....etc. Me senti cobrada, quanta indelicadeza.

O pior não era apenas isso. Após os abortos, ficamos sabendo de muitos casos de abortos espontâneos...era acontecer um que alguém insensível me telefonava em casa pra contar o caso e no final eu sempre ouvia: "Tá vendo...acontece com muita gente...". Uma vez uma pessoa me ligou pra contar de uma moça que perdeu seu bebê com oito meses de gestação, a situação deve ter sido terrível pra esta mulher, não tenho a menor dúvida, o cruel pra mim foi ouvir: "Que bom que com você foi no começo né? assim não viu a barriga crescer, o bebê mexer..."

A dor é um sentimento extremamente individual, realmente não vi minha barriga crescer e não senti meus bebês mexerem, mas eu os tinha como meus filhos. Acredito que não faz diferença perder um filho com um dia ou com 10 anos de vida, perder alguém que já amamos é dolorido, não importa o tempo que vivemos e as experiências que tivemos com aquela pessoa. Sabemos que a morte é algo real, é a única certeza que temos, todos morreremos, mas não gostamos nem um pouco da morte e não estamos prontos pra lidar com ela.

Sei que essas pessoas queriam o meu bem e de certa forma me consolar, saber disso me acalmava e me ensinou que lidar com pessoas e com a dor do outro exige profunda sensibilidade e empatia, nunca, mas nunca mesmo podemos esquecer que a dor é individual!

2 comentários:

Anônimo disse...

Eu sempre quis te ligar, mas nunca soube o que dizer... pelo menos não disse essas coisas neah?

:)

Débora disse...

Sei que nessas horas é dificil ter o que dizer, mas um telefonema ajuda muito, basta ser sincero, teve quem me disse: "não tenho nem o que falar...", apenas saber que tem alguém ali que é solidário a você já ajuda muito. Acho que o mais dificil é lidar com a aparente indiferença das pessoas à sua dor.